21 ene 2012

paráfrase de min



debería algunha vez eu
chamar por min moi seriamente
e preguntar a todas as cunchas esfrangulladas do meu eu
serenamente
onde van as flores que nunca abriron
onde as sementes
das que terían que ter xermolado
os meus máis ledos pensamentos 
inocentes
podería eu por min chamar
algunha vez
lucidamente
e demandar por correo unha
toma de terra que me asente
niso que coido ser
e que probablemente
non consiga diferenciar
do que o resto da xente é

poedría eu formularme unha cuestión
máis que transparente
para os mapas onde xacen agochadas
as cartografías máis internas da miña mente escindida
en mundos indiferentes
e ao mesmo tempo
un único mundo displicente
alí onde incido unha e outra vez
de maneira louca e intermitente

si, debería eu procurar un número que fose meu
e chamarme e preguntarme
como anda todo no cemento do cemiterio
e na diáspora de min mesma
sempre perseguindo as aves vivas do presente continuo
en que me perdes
porque entre os dous hai un río de lodo
fosforescente
e un volcan de lava deterxente.........








8 ene 2012

delicatesen





Falarei baixo 
Para não perturbar tua amiga adormecida 
Serei delicado. Sou muito delicado. Morro de delicadeza. 
Tudo me merece um olhar. Trago 
Nos dedos um constante afago para afagar; na boca 
Um constante beijo para beijar; meus olhos 
Acarinham sem ver; minha barba é delicada na pele das mulheres. 
Mato com delicadeza. Faço chorar delicadamente 
E me deleito. Inventei o carinho dos pés; minha palma 
Áspera de menino de ilha pousa com delicadeza sobre um corpo de adúltera. 
Na verdade, sou um homem de muitas mulheres, e com todas delicado e atento 
Se me entediam, abandono-as delicadamente, desprendendo-me delas com uma doçura de água 
Se as quero, sou delicadíssimo; tudo em mim 
Desprende esse fluido que as envolve de maneira irremissível 
Sou um meigo energúmeno. Até hoje só bati numa mulher 
Mas com singular delicadeza. Não sou bom 
Nem mau: sou delicado. Preciso ser delicado 
Porque dentro de mim mora um ser feroz e fratricida 
Como um lobo. Se não fosse delicado 
Já não seria mais. Ninguém me injuria 
Porque sou delicado; também não conheço o dom da injúria. 
Meu comércio com os homens é leal e delicado; prezo ao absurdo 
A liberdade alheia; não existe 
Ser mais delicado que eu; sou um místico da delicadeza 
Sou um mártir da delicadeza; sou 
Um monstro de delicadeza. 



VINICIUS DE MORAES:  Elegia ao primeiro amigo (fragmento) , texto íntegro AQUÍ